Refletir sobre a (In) disciplina pressupõe buscar soluções para sanar ou pelo menos amenizar a questão do desrespeito aos direitos alheios, pois, percebe-se hoje, que o comportamento de desrespeito não limita-se ao interior da sala de aula, está presente em várias situações de atuação, seja no trânsito ou em forma de corrupção. É necessário voltar a atenção para construção da auto disciplina. Esta, deve iniciar-se dentro da escola, com um
trabalho coletivo em que a comunidade escolar e a família assumam a importante contribuição no processo de construção da autonomia e consequentemente da disciplina dos indivíduos.
PALAVRAS CHAVES: Autonomia – Família – Indivíduo – Escola – Autodisciplina.
Atualmente é possível verificar que a falta de disciplina, enquanto forma de comportamento, está se manifestando de forma explícita em diversificados momentos da atuação dos indivíduos. Seja ultrapassando um sinal vermelho no trânsito ou tumultuando a aula de um professor, o ser humano demonstra certa necessidade de construir sua auto disciplina.
É válido ressaltar a mudança de sentido ocorrido na palavra “(in) disciplina”. Selma Garrido a partir de uma análise histórica da fase tradicional e individualista, tece o seguinte comentário no prefácio da obra “Disciplina” de Vasconcelos (1998): “… a disciplina é instrumento de autoritarismo, refreadora do desenvolvimento dos outros, é instrumento de ordem imposta, de subordinação e submissão, propiciadora da invenção de mecanismos de
castigo e tortura…”. Já de uma forma moderna e coletiva, Vasconcelos na mesma obra, cita Nidelcoff: “Disciplina é sinônimo de trabalho, diálogo, camaradagem, afeto e respeito mútuo”.
Na primeira citação, observa-se que, disciplina é associada à idéia de limite imposto, em geral sem sentido, ou seja, simplesmente limite por limite. Por outro lado, na segunda citação, disciplina é associado a questão do limite com sentido, com uma finalidade, o que leva o indivíduo a construí-la e não ser somente submisso a ela.
A crise dos valores vivenciada pela sociedade, faz com que pais e educadores sintam-se inseguros no momento de estabelecerem limites para as crianças. Duas situações justificam esta insegurança: receio de repetirem a educação autoritária recebida de seus pais e a falta de conhecimento de como se processa o desenvolvimento moral da criança.
Em geral, educadores e pais sentem-se inseguros na hora de fixarem regras para as crianças, pois, temem ações autoritárias iguais as que experimentaram. A mercê desta insegurança, não estabelecem parâmetros ou regras auxiliando as crianças na construção da sua autodisciplina.
A falta de conhecimento de como se processa o desenvolvimento moral da criança, também faz com que o adulto se omita diante da construção da disciplina. Piaget , afirma que a criança nasce com ausência total de regras. Mais tarde, com a interação familiar (basicamente) inicia-se o processo de construção se si e dos outros, como também de coisas que podem ou não serem feitas.
Através das duas situações referidas anteriormente, verifica-se a necessidade de elaboração de regras junto com as crianças, bem como, a manifestação de referencias dos mais velhos (pais, irmãos e educadores), pois, diante de limites construídos coletivamente, a criança sente-se protegida, segura, amada e respeitada, assim como aprende a escolher e priorizar suas vontades.
A construção da auto disciplina passa pelo pressuposto do respeito mútuo, é o que admite Kamii(1991), baseada em Piaget: “A criança que se sente respeitada na maneira de pensar e sentir é capaz de respeitar a maneira como os adultos pensam e sentem”. Este fato pode ser observado em sala de aula, quando o professor substitui a imagem de um ser autoritário, pela imagem de um coordenador no processo de construção da disciplina.
O desenvolvimento da autonomia é fator básico para construção da autodisciplina. Pois, autonomia significa autogoverno, conhecimento de si mesmo, consciência de seus direitos e deveres e acima de tudo, respeito aos direitos dos outros.
Há alguns anos, este processo de construção da disciplina iniciava-se no interior da família. Entretanto, hoje, as crianças estão indo para a escola mais cedo, dois ou três anos de idade, o que faz com que a escola comece a participar do processo de formação moral e intelectual praticamente no início. Seja por necessidade profissional ou simplesmente questão de opinião dos pais, o fato é que, a escola acaba assumindo uma responsabilidade
grande na construção de valores essenciais à vida humana.
Autores como Tiba ( 1998), ressaltam com muita precisão, a contribuição da escola e da família na formação da criança, chamando a atenção para um trabalho em parceria e comprometido principalmente com o desenvolvimento moral da mesma.
Mencionam também que, a participação dos pais junto à escola, não pode se restringir simplesmente ao fato de participarem das reuniões, mas sim, mostrarem-se atentos e disponíveis para ajudarem a solucionar os problemas que surgirem na escola. Da mesma forma, a escola deve estar atenta aos problemas familiares que influenciam o
desenvolvimento moral e intelectual da criança.
Constata-se através das diversas situações apresentadas que, a criança não constrói a autodisciplina sozinha, e por isso, tanto a escola como a família, não podem se omitir diante da importante missão de contribuir para a formação de um ser autônomo e consequentemente autodisciplinado.
Referências Bibliográficas
KAMII, C. A. A autonomia como finalidade da Educação: implantações da teoria de Piaget.
In: A Criança e o número. Campinas: Papirus, 1991.
_______.A Criança e o número: implantações educacionais da teoria de Piaget para a
atuação junto a escolares de 4 a 6 anos. Tradução de Regina A. de Assis. Campinas:
Papirus, 1984.
TIBA, I. Ensinar Aprendendo: Como superar os desafios do relacionamento professoraluno em tempos de globalização. São Paulo: Gente, 1998.
VASCONCELOS, C. dos S. Disciplina: Construção da disciplina consciente e interativa em
sala de aula. São Paulo: Liberdade,1998.
Marilene Nunes
Coord. do curso de Pedagogia
Faculdade Única
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